sexta-feira, 29 de outubro de 2010

Segurança na internet. Segurança, para quem?


O estado controla, oprime e mata. Isso é fato. No entanto, a internet para muitos ainda é aquela utopia libertária, espaço de liberdade plena onde segurança e prevenção não passam pela cabeça dos indivíduos. Para certos reacionários a internet é o meio de projetar todos os seus anseios, seria um espaço onde as leis e as restrições atingiriam um grau máximo. A utopia do controle total, do grande irmão orwelliano em 1984, quando o computador torna-se a teletela.  

      Devemos nos alertar, dentre as duas utopias possíveis a dos reacionários vem se materializando gradativamente. As leis antiterroristas europeias, em especial a francesa de 2006, o projeto de lei Azeredo (AI-5 digital) e mesmo o anteprojeto de lei antiterrorista brasileiro, que não foi aprovado graças à Zeus, são provas de tentativas de um aumento do controle estatal e diminuição dos direitos individuais fundamentais em diversos âmbitos, inclusive na internet.

      O caso do antiterrorismo na França é nitidamente a criação de um estado todo-poderoso. Seguindo a linha dos Estados Unidos que após os atentados de 11 de setembro criou o Patrioct Act, a França em 2006 aprova a lei do antiterrorismo. Reconhecendo ser uma nação “excessivamente” democrática percebe que a liberdade de expressão pode ser um meio de propaganda terrorista eficaz, principalmente através da internet; o direito à reunião pode possibilitar o encontro de ameaçadoras pessoas; o direito à vida privada dificulta o trabalho de investigação da polícia; e o direito à livre movimentação dentro do país dificulta o controle estatal e o rastreamento. Logo, juridicamente, a lei antiterrorista fere direitos que antes deveriam ser garantidos por qualquer nação “civilizada”: qualquer pessoa pode ser presa por suspeita de participação ou colaboração com terroristas, violando o princípio básico da presunção de inocência; o tempo de custódia máxima passa de 24 à 96 horas, além disso só depois de 72 horas que passa-se a ter direito a um advogado, dando brechas a interrogatórios criminosos (já houve relatos de privação de sono, alimentos, etc); outro princípio violado é o da inadmissibilidade de provas obtidas ilicitamente, com esta lei qualquer prova, mesmo vindo de um país que se utiliza da tortura como meio de investigação, é aceita esquecendo-se todos os contratos que visavam garantir os direitos humanos; existem ainda vários outros princípios gravemente violados.
     
      Em novembro de 2008 dez anarquistas foram presos em Tarnac, na França. Acusação: sabotagem nos trilhos de uma linha de trem-bala. Provas: nenhuma, o máximo que os investigadores conseguiram foi um catálogo de horários de trem na lata do lixo, mas eram suspeitos por possuírem toda aquela literatura subversiva em casa e pela proximidade com os meios libertários. Onde moravam, um sítio afastado da cidade, a polícia havia colocado câmeras, seus telefones eram grampeados e também o rastreavam pela internet. Todo um aparato policialesco para tentar incriminar tais pessoas e mesmo assim não conseguiram. Então se utilizaram da lei antiterrorista e os prenderam mesmo sem provas, um dos acusados ficou 6 meses preso e agora que foi solto tem que bater ponto periodicamente na delegacia, não pode ver seus amigos acusados e tem que morar na casa dos pais mesmo já estando na casa dos 30 anos! A lei antiterrorista cai como uma luva de boxe para ajudar o estado a bater nos que se contrapõem a ele. Foi por conta dessa possível criminalização dos movimentos sociais que a lei antiterrorista brasileira não foi aprovada, mas ela continua engavetada, não foi pro lixo. O interessante é que grande parte do que esse anteprojeto de lei categorizava como terrorismo eram práticas comuns a organizações como MST e Via Campesina, é clara a intenção da criação de um subterfúgio legal para legitimar qualquer ataque contra os movimentos sociais.

      Isso tudo para mostrar que a preocupação com a segurança na internet não é paranoia, muito pelo contrário é a preocupação de se defender antes de ser atacado. O ataque pode estar bem próximo. A lei Azeredo, por exemplo, prevê que os logs devam ser guardados por até 3 anos pelos servidores para uma possível investigação policial caso ela venha a ser necessária. Além disso, um cadastro será obrigatório aos internautas, havendo assim um claro controle de quase tudo que acontece no mundo virtual. Isso são meros exemplos de diversos absurdos que propõe esse AI-5 Digital. Junto a isso, a inteligência da polícia tem treinado tecnicamente com os casos de pedofilia, não raro escuta-se que algum pedófilo foi preso por rastreamento de IP por exemplo. O Brasil lidera o combate contra a pedofilia, a Argentina mesmo já entrou em contato para saber como conseguiu-se juridicamente fazer com que a Google liberasse os IP's de suspeitos no Orkut para investigação. Para que esse conhecimento da polícia seja transferido para um setor “mais preocupado com as movimentações políticas” basta um piscar de olhos.

      Algumas alternativas são facilmente encontradas. Em relação ao Google existe a possibilidade de se utilizar o scroogle, esse site redireciona a busca, não fazendo ligações entre a busca feita pelo internauta e o seu IP. Na mesma lógica funciona o Tor, mas com algumas especificidades. Essa ferramenta proporciona navegar nos sites com o IP camuflado, basta instalar o aplicativo, fazer certas regulações no navegador, e tudo certo só que mais lento. Com esse processo de camuflagem de IP a conexão fica um pouco mais lenta, caso a conexão não seja muito boa utilize-o apenas naquelas sites que muito provavelmente a polícia range os dentes quando o acessa. Servidores alternativos e mais seguros para emails também são uma boa opção, o Riseup é altamente recomendável. Por fim dessa pequena lista de alternativas propõem-se a criptografia de documentos, nada que um tutorial procurado no scroogle não resolva. A ideia é criar uma senha pra certos documentos que só o usuário terá acesso, descriptografar é possível, assim como é possível fazer de um fio de cabelo um canudo.

      O ilustríssimo senador Eduardo Azeredo disse: “Sem regras nesse assunto, a internet vai continuar sendo terra de ninguém”. Que assim seja. E que nessa terra de ninguém nos organizemos.

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